Hoje falaremos sobre o envelhecer e o significado dessa transformação em nós e na sociedade. O que me levou a querer escrever sobre esse assunto foi a enorme quantidade de manifestações contra as atrizes Fernanda Montenegro e Nathalia Timberg, que interpretam o casal homossexual na novela Babilônia. Percebi que os comentários, além da não aceitação ao amor gay, tem um tom depreciativo em relação a idade das protagonistas. Parece que envelhecer significa desligar os motores e se preparar para a morte.
Fernanda Montenegro deu uma entrevista rica e elucidativa ao falar da personagem e da trama dramatúrgica, mencionou a expressão “caça as bruxas” e o que se verifica nos comentários de uma parcela do público são compreensões rasas, preconceituosas, sem a menor reflexão sobre o assunto.
Envelhecer pode significar maturidade, experiência de vida, bagagem rica emocional e histórica. Também significa mudanças e perdas. O corpo perde muito, mas a alma, dependendo da capacidade de absorção e transformação no processo da vida, só tende a crescer, a enriquecer.
O próprio termo idoso remete já a uma categorização e marca as pessoas como se marcam gados, por exemplo.
Minha avó materna tem 87 anos. É uma mulher extremamente adorável, cheia de vida, fé, amor e alto astral. Até uns meses atrás frequentava o Clube que é sócia todos os dias. Fazia ginástica e musculação. Dirigia, do jeito dela, mas dirigia seu carro manual e antigo. Não queria trocá-lo de jeito nenhum, pois sentia-se segura nele. Onde ela vai encanta as pessoas. É querida por todos! A família brinca que no dia que ela morrer vai ter tanta gente que vão achar que ela devia ser uma celebridade.
E ela é, célebre da vida! Nunca me esqueço dela me contando que numa viagem que fez aos Lençois Maranhenses, há uns sete anos, ela que as vezes dizia que já estava satisfeita com a vida, assistindo a um por de sol ao som de violinos, rezou e pediu a Deus para estender sua estadia na Terra, pois queria se alimentar mais de momentos como aqueles!
Amadurecimento e expansão da alma
Envelhecer é continuar sendo. É continuar a criar e recriar o mundo, como fazemos desde o momento em que nascemos. Nos tornamos e continuamos a nos tornar a partir do que recebemos, experimentamos e criamos. Deixamos nossas marcas sim. Marcas que asseguram nossa existência e que nos dão a sensação de que a vida é bela.
Diferentemente de marcas acusatórias, carregadas de pré-conceitos e projeções do mundo interno desconhecido de cada um. Marcas que rotulam e diminuem a experiência humana e da própria vida.
O amor é a expressão mais tocante que nos leva a experiência de alteridade, a capacidade de se colocar no lugar do outros. Enxergar todos os seres humanos e outros seres que compartilham a existência em nosso planeta com direito à felicidade, properidade, abundância ainda fica no plano da utopia. Mas, a utopia pode ser a bússula de caminhos a trilharmos.
A idéia de ser idoso já carrega tantas marcas, inclusive do caminho rumo à morte, que fica quase que impossível imaginar a sexualidade como expressão natural do desejo humano nessas pessoas. Uma grande parcela de estranhamento advém também das campanhas da mídia que associam-na à jovens e à pessoas em torno de 30 a 50 anos, além das crenças sociais e culturais herdadas ao longo dos anos. Se consideramos que a vida mental e emocional não envelhece e sim amadurece, por que o desejo irá desaparecer? O corpo e a alma continuam necessitando de toque, de carinho, de carícias. O prazer sexual faz parte de uma vida saudável.
Quem sabe esse casal de mulheres (atrizes e personagens) vividas e vívidas, em Babilônia, possam tocar os corações cristalizados daqueles que poderão vir a sofrer muito ao envelhecer, caso não se tornem abertos e maleáveis a diversidade que a vida nos propõe.
Cristina Ciola Fonseca
Psicanalista
(11) 5052 9286 / 99850 9074
crisciola@hotmail.com
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