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Dr. Richard Davidson ilustrado por Ajani Oloye

Há quase 20 anos, o monge budista e líder político e religioso do Tibet colocou o dedo numa questão científica que muito em breve se tornaria uma revolução no nosso conhecimento sobre o cérebro: o poder de a mente influenciar a arquitetura cerebral.

Nos anos 90, Tenzin Gyatso – como o Dalai Lama se chama – acompanhava uma cirurgia cerebral. Durante o processo ele perguntou aos neurocirurgiões se a mente podia alterar o cérebro. Os médicos responderam aquilo que era mais prudente, considerando as evidências, isto é, até onde se sabia, a mente era apenas um reflexo da atividade eletroquímica do cérebro, portanto, o que acontecia ali era o que estava acontecendo na mente. Essa resposta não satisfez muito o monge budista, ele continuava tendendo a achar que alguma espécie de “pensamento puro” poderia sim alterar a estrutura cerebral.

Em certo sentido, Gyatso tocou num ponto que, quando pesquisado, viria a revolucionar nossa compreensão sobre o cérebro: a neuroplasticidade. Antes da descoberta desse fenômeno, achava-se que nosso cérebro possuía uma quantidade de neurônios que não se alterava nunca. Se algum fosse destruído em algum momento, ficaria com aquela falta e todas as consequências decorrentes daí para sempre. Assim, a descoberta da neuroplasticidade (capacidade do cérebro de se remoldar) significou uma nova esperança para aqueles que sofreram derrames ou que sofriam de qualquer outra condição com prejuízo cerebral, pois significava que, através de exercícios e terapia, o cérebro poderia reaprender aquela tarefa prejudicada. Por exemplo, alguém que parou de mover um braço por causa de um derrame, poderia recuperar os movimentos através de uma terapia especializada.

Mas o Dalai Lama estava se referindo a outro tipo de controle sobre a matéria (cérebro). Não era algo que se conseguia através de exercícios, mas através do puro pensamento, como ele diria.

Em 2002, a neurocientista Helen Mayberg, descobriu que pílulas placebo exerciam o mesmo efeito sobre o cérebro (em alguns casos, claro) que os anti-depressivos. Isso trouxe uma maior necessidade de aprimoramento dos estudos nos quais as indústrias farmacêuticas se baseiam para criar seus medicamentos, mas também fez a comunidade científica ficar alerta para o poder do pensamento interferir na atividade eletroquímica do nosso cérebro.

Esse controle já era oferecido, de certa forma, através da terapia cognitivo-comportamental (TCC). Esse tipo de terapia age fazendo com que o paciente aprenda a mudar sua forma de pensar, o que, consequentemente, muda seu comportamento e seus sentimentos e emoções em relação ao problema e à vida em geral também (Almeida & Neto, 2003).

Os estudos sobre a neuroplasticidade não se resumem às terapias, remédios e aprendizado. O Oriente, especialmente no que se refere ao Budismo Tibetano, está fornecendo evidências importantes sobre a validade da neuroplasticidade e, também, sobre a eficácia da meditação como ferramenta para mudar profundamente as pessoas, inclusive suas formas de pensar.

Oito monges budistas que possuem uma prática de pelo menos 10.000 horas de meditação foram voluntários num experimento ao lado de um grupo de 10 voluntários que praticam meditação há pouco tempo, tendo feito apenas algumas aulas. Foi pedido que todos fizessem a meditação da compaixão ilimitada por todos os seres, uma prática meditativa que, segundo os budistas, aumenta a capacidade compassiva dos indivíduos. Para analisá-los, dezenas de eletrodos foram colocados em suas cabeças para que fosse realizada uma eletroencefalografia.

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Richard Davidson, diretor do Laboratório de Neurociência Afetiva da Universidade de Wisconsin-Madison e P.h.d.em Harvard, autor da pesquisa, utilizou também a ressonância magnética funcional para ver quais regiões cerebrais ficavam ativadas durante a meditação de compaixão. Segundo os dados achados, as áreas ativadas tinham relação com as emoções, planejamento e geração de emoções positivas, como a felicidade. Já as regiões que parecem manter a nossa unidade, aquilo que chamamos de “eu”, “self”, estavam muito fracamente ativadas. Curiosamente, o cérebro dos monges mostravam grande ativação nas áreas relacionadas ao amor materno e empatia, como a ínsula direita e caudado. Numerosas conexões – em relação ao cérebro dos novatos – entre o córtex frontal e as áreas ligadas às emoções foram encontradas, o que é um reflexo do primoroso controle sobre as emoções que os monges desenvolveram, como prega um dos objetivos da prática budista.

O estudo do cérebro dos monges e meditantes ajudou a neurociência a reformular várias posições sobre a natureza do cérebro e das emoções humanas. E, se depender da autoridade política e religiosa do Tibet, novos frutos ainda surgirão.

Fonte: SocialMente

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Se você quiser conhecer melhor a capacidade do cérebro de se moldar a uma vida plena e feliz, deixando de lado pensamentos negativos e padrões emocionais destrutivos, minha sugestão é o livro “O Cérebro de Buda”, de Rick Hanson, ed. Alaúde. Nele, o autor neurocientista descreve os processos naturais do cérebro, as reações dos hormônios, e sugere exercícios baseados na prática budista para agir nesta programação de forma realizar felicidade e satisfação plena todos os dias.

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